2º Seminário retoma debate do Marco Regulatório entre Estado e Organizações Religiosas
Mais de 60 pessoas, entre representantes de organizações religiosas, da sociedade civil e do governo, participaram do 2º Seminário Relação Estado e Sociedade, que ocorreu nos dias 30 de setembro e 1º de outubro, no Centro Cultural de Brasília (CCB). O evento, que fez parte da segunda edição do Coletivo Inter-Religioso, foi protagonizado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e proporcionou uma retomada da discussão sobre o marco regulatório, iniciado em novembro passado, no 1º seminário, e proporcionou novo debate sobre a relação cooperativa entre religião e Estado. O evento reuniu, entre outras entidades, representantes do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), Conselho Latino-americano de Igrejas (Clai), Federação Espírita Brasileira (FEB), Aliança Cristã Evangélica Brasileira.
De acordo com o assessor da CNBB, Pe. Geraldo Martins Dias, as ações do 1º Seminário, apresentadas em 14 propostas favoráveis ao diálogo entre sociedade e Estado, não foram concretizadas e reconhecidas nas ações de assistência social. “Estamos preocupados que o reconhecimento dessa atuação na ação social não seja mera retórica, mas que se efetive na configuração do arcabouço legal”, opinou o assessor. Para o advogado da CNBB, Hugo Sarubbi, ainda prevalecem as reinvindicações: “Insistiremos para que aquelas proposições se efetivem, pois não houve consonância daquilo que foi conversado no 1º Seminário. Esse seminário é uma nova provocação para que as Políticas Públicas sejam cumpridas”, explicou Sarubbi.
Estado Laico requer regulamentação e menos descaso
Mediados pelo Pe. Geraldo Martins (CNBB), os debates do primeiro dia do seminário (30/09) trouxeram à tona o descaso do governo com as demandas levantadas pelo grupo em novembro do ano passado. Para a secretária geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristães do Brasil, a pastora Romi Marcia Bencker, a sociedade ainda vive num contexto de ameaça a vários direitos sociais conquistados, o que indica uma falta de organização generalizada. “Nossa primeira frustração foi a de saber que o documento entregue ao ministro não saiu da secretaria. Sugerimos que as propostas fossem debatidas com todos os ministérios e entregues à presidenta Dilma e nada disso foi feito”, lamentou a pastora.
Já o representante da CNBB Daniel Rech disse que o grupo não está otimista, pois não houve nenhum avanço. “Salvo pela aprovação da MP 620, que beneficia em vários aspectos as entidades filantrópicas, nada se avançou a respeito do reconhecimento das Instituições Religiosas, no entanto, a realização desse seminário reforçou uma segunda tentativa de articulação entre as Organizações da Sociedade Civil, religiosas e Estado”, concluiu.
Flamarion Vidal de Araújo da Federação Espírita Brasileira (FEB) chamou a atenção para os 25 anos de promulgação da Constituição Federal sem regulamentação específica para a questão das organizações religiosas: “A legislação é uma ‘colcha de retalhos’, não há consenso, pois os responsáveis agem sempre de uma maneira bastante pontual”, opinou. Flamarion destacou também alguns artigos constitucionais que falam sobre o Estado Laico e o papel das organizações religiosas, no entanto, segundo ele, todas sem regulamentação e sem entendimento político. “Um país Laico deve respeitar e garantir a ação de todas as religiões, mas para o Estado, essa concepção de ‘Laico’ parece ser entendido como um tipo de ateísmo, ou seja: não há a credibilidade do Estado em relação à religião, é como se isso não existisse”, lamentou o delegado.
Grupos de trabalho propõem ao governo um novo documento
Durante a manhã do segundo dia do evento, representantes das organizações religiosas dividiram-se em três Grupos de trabalho (GTs) e formularam novas proposições, consolidadas numa nova carta, na qual reiteraram as reinvindicações anteriores e propuseram mais ações, tais como: o reconhecimento por parte do Estado brasileiro das organizações religiosas como entes legítimos de direito privado para desempenhar suas atividades; o reconhecimento da função social das organizações religiosas; a criação pelo governo de um mecanismo permanente de diálogo e interlocução com as organizações religiosas no processo de construção do marco regulatório; o reconhecimento da importância dos fundos solidários nos processos de fortalecimento da democracia e exercício da cidadania; criação de políticas e mecanismos de disponibilização de recursos destinados aos fundos solidários; e a garantia que o recurso público acompanhe e assessore as operações dos fundos.
No final do Seminário, a carta foi entregue ao senador Rodrigo Rollemberg e ao secretário geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, pelo presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz, bispo dom Guilherme Werlang. Em seu discurso, dom Guilherme pediu o empenho do governo federal e do Congresso Nacional na aprovação de regras claras para as relações das organizações da sociedade civil com o Estado. “Queremos um marco regulatório que ponha fim à constante criminalização injustamente sofrida por essas organizações que, na sua imensa maioria, dão novo sentido à vida de milhões de irmãos e irmãs empobrecidos ou privados de seus direitos”.
Gilberto Carvalho, por sua vez, comprometeu-se de encaminhar a carta à Presidenta Dilma, apesar de considerá-la “dura”: “Eu já sabia que o teor desse documento não seria de elogio, mas, mesmo assim quero acolhê-lo, por ser uma causa justa e entregá-lo ainda hoje à presidenta”, prometeu o ministro.
Para a pastora do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC), Romi Bencker, o Seminário consolidou o Coletivo Inter-religioso e demonstrou a insatisfação com o pouco avanço na tramitação do marco regulatório. “Entregamos esse documento ao poder legislativo e ao executivo, e vamos torcer para que não fique no vazio. O grupo vai ser mais ativo e monitorar mais de perto esse assunto, e buscar também a presença de mais organizações religiosas, que não cristãs, ao Coletivo”, completou a pastora.
Brasil Marista participou ativamente dos debates e da construção do marco regulatório
O Seminário contou também com o apoio da União Marista do Brasil (UMBRASIL) e do Grupo Marista. De acordo com a assessora das Relações Institucionais do Grupo Marista da Província Brasil Centro-Sul, Arlete Dias, foram dois dias extremamente importantes e, apesar de o seminário ter contado com um público bem menor do que o do anterior, ele foi de alta qualidade e mais diversificado, contando com várias outras representações religiosas. “Isso trouxe a esperança de construirmos juntos não só uma agenda com relação à legislação para as isenções tributárias, mas também com relação à liberdade religiosa, porque é esse o verdadeiro tema do evento”, opinou a assessora.
Arlete relembrou ainda que o Grupo Marista vem contribuindo muito para aprimorar o marco regulatório, que é um conjunto de normas leis e diretrizes que regulam o funcionamento de setores, nos quais entidades privadas prestam serviços de utilidade pública, como a assistência social promovida pelas entidades religiosas. O Grupo Marista atuou efetivamente nas áreas de educação, assistência social e saúde, não visando apenas à instituição, mas ao coletivo social. O resultado dessa ação compôs o escopo da MP 620, que contemplou também adequações para entidades filantrópicas e que está agora em processo de sanção presidencial. “Questões como a remuneração dos dirigentes, educação básica e superior, assistencialismo social e facilidades nas certificações das entidades beneficentes e filantrópicas foram longamente debatidas por nossos grupos de trabalhos e finalmente acolhidas pelo MEC e pelo legislativo”, relembrou a assessora.